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As pessoas parecem ter no rosto “gelatina inútil”, que é como o Conde de Gloucester se referiu aos seus olhos em “Rei Lear” de William Shakespeare.Aliás “Lear” é uma anagrama de "real" como se Shakespeare quisesse dizer que o rei via uma versão distorcida do real.
Estou convencido que as pessoas são mesmo cegas, não porque não enxergam, mas porque vêem aquilo que foram condicionadas a ver. Essa é só mais um dos descaminhos do mundo e do lado escuro da vida. Viver na escuridão imaginando-se na luz é só mais um dos disfarces da enganação. Um olho que vê pode ser cego sim.
As formas são apenas meros rascunhos, úteros inférteis que não dão a luz a profundidade, o invisível nem sempre salta aos olhos, mas quem entre nós poderá bradar aos quatro ventos que nunca ficou cego diante da ilusão que nossos olhos aprenderam a acreditar ser real? Quem entre nós mortais poderia atingir o grau de pureza como dizia Saint Exuperry ser possível com a frase : “ Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.”
O corpo é faminto demais pra deixar se levar apenas pelo coração, embora ele queria dizer que é preciso ver o mundo de uma maneira mais pura, o coração infelizmente também pode ser cego quando tomado pela paixão, o outro pode estar todo coberto de lama que nos parecerá brilhar de tão limpo quando por ele estamos loucamente e cegamente apaixonados.
A visão só se apura e os olhos só deixam de ser gelatina inútil quando ganhamos intimidade com o mundo, quando conseguimos sobrepor sobre o que vemos como na sinestesia, relacionando planos sensoriais diferentes, como o gosto com o cheiro, ou a visão com o olfato. “O doce afago materno.” (paladar + tato).Dizem que a visão de halos ou auras em volta dos corpos humanos é um fenômeno sinestésico. “Ora (direis) ouvir estrelas!”, primeiro verso do Soneto de “Via Láctea” é um ato sinestésico de Olavo Bilac.Há sinestésicos que ao irem a uma festa e se divertirem vêem em volta de tudo a cor azul. Pelo fato dos sistemas sensoriais se interconectarem entre si pode-se ver cores quando ouve-se um som, ou você pode sentir o gosto das palavras
Parece maluquice, mas a loucura , embora seja classificada como delírio ou insanidade, parece ser sempre mais genial que a “normalidade”.

André Luis Aquino